Vértices de Esperança

 

VÉRTICES DE ESPERANÇA

 

No solo cálido, a cal embalsama o lodo,

Da crosta árida, emudecida de guerra,

E o sol em júbilo, queima a lavra ao podo

De forja insólita a incendiar a terra.

 

Na pele rústica, o suor em prece irrompe,

É lágrima esculpida em sal e labareda,

O vento álacre traz o pó que o corrompe,

Alma que exsurge sob a cruz e a vereda.

 

A fome em riste desenha em vão seu traço,

Em pratos órfãos do milagre prometido;

Enquanto a chuva é quimera em falso abraço,

O céu desdenha o clamor do desvalido.

 

Cisternas viram espelhos de ilusão,

Canais se perdem nas veias dos coronéis;

A água está no cárcere da opressão,

Irriga apenas os jardins dos seus papéis.

 

Promessas ecoam no áspero Palácio,

Mas são balidos no abismo do poder;

Enquanto o homem vive à língua e no silêncio,

Os grãos de ouro enriquecem o desprazer.

 

A lua é lâmina que fende a noite seca,

Revela em sombras os espectros da fome;

Nos campos mortos, cada espinho lhe sapeca,

É a flor sombria que, em dor, o chão consome.

 

A dança enxada numa valsa de agonia,

Em braços fracos pela ausência do feijão;

Mas cada golpe ao pó carrega a poesia,

De um sonho bruto sufocado pela mão.

 

O gado magro rumina o próprio osso,

Os urubus vigiam o fim do amanhecer;

No céu revolto, cada estrela é um colosso

Que observa impávida o sertão a se perder.

 

A fé, porém, é fortaleza incorrupta,

O sertanejo é rocha em carne e coração;

Cada promessa lhe deságua em labuta,

Pois na cegueira há força em contramão..

 

E assim, o ciclo do sertão é seu calvário,

Recria a luta que nos versos se eterniza;

Do São Francisco ao agreste imaginário,

O homem chora, mas seu sangue vitaliza.


Edson Depieri

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

SONETO DE REGÊNCIA

REDONDILHAS DE CAPELA

ETERNO AMOR

ELA

MEU RECANTO

SOBERANO

CONTORNOS DO ETERNO

HERÓIS DA ETERNIDADE

SONETO DE LAMENTAÇÃO